Nem mulher-maravilha, nem donzela-na-janela
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Quantas vezes atropelamos e desconsideramos o sinal de que seria preciso dar pausa? Quantas vezes nos esquivamos de vivências importantes por querermos esperar o tempo em que estaremos “prontas”? Em cada um desses extremos, perdemos de vista o que realmente importa.

De um lado, o corre-corre: o relógio como um oponente cruel com quem acreditamos travar uma luta. Esse jogo, porém, tem cartas marcadas e quem costuma sair perdendo é nossa energia, nossa saúde, nossas relações. Luta-se contra as linhas no rosto, luta-se contra os sinais de fadiga, luta-se contra os limites.

O mundo acelerado gera publicidade e nela se vende a idéia de que aquele que não acompanhar o ritmo imposto ficará pra trás. Mas qual será o fim dessa viagem? Dá tempo de pensar se quero isso para mim? São tantas horas preenchidas na agenda que, quando temos uma folga, precisamos logo pensar com o que iremos preencher. Não há tempo para estar consigo mesma, para viver os ciclos naturais, e não apenas seguir adotando o que se vende como o ideal.

Outra postura é a que usa o tempo como fuga. Em algumas situações, nos pegamos escondidas por trás de justificativas cabíveis racionalmente, mas que servem, no fundo, à vontade de tudo controlar, ao orgulho que não admite erros, ao medo de não ser boa o suficiente. Esperar estar pronta, em muitos momentos, é uma maneira secreta de esconder o que ainda não sabemos com uma máscara do tipo: “oh, sim, sei dar tempo ao tempo”, quando se poderia dizer na realidade: “não vou me expor, enquanto não tiver plena certeza”. E essa certeza, quando chegará? Enquanto não chega, vamos vivendo pedaços.

Quaisquer desses caminhos me parecem meios de fugirmos do agora. Esse misterioso tempo que nos escapa cada vez que tentamos controlá-lo é o único tempo no qual é possível criar, agir, viver. Correr loucamente atrás do amanhã nos torna mulheres mais cansadas, envelhecidas (e não maduras), indispostas, estressadas. Fugir loucamente do hoje nos torna alienadas e nos deixa com a sensação de que nada podemos.

Nos desafios vividos no presente é que descobrimos que esse é o único caminho que podemos trilhar. É imprescindível um horizonte que se deseje alcançar, mas é preciso também pisar no chão que está imediatamente debaixo dos pés para que se possa chegar a algum lugar.

Escolher o caminho da alma não equivale a seguir um caminho de facilidades mas, sim, construção e renovação constantes. É sempre se ver a caminho, é sempre notar que há algo mais de misterioso e de essencial a se descobrir.

Sentir essas conclusões em minha vida me fez estar mais presente, mais inteira. Tenho respeitado as pausas pedidas pelo meu corpo, pela minha alma, pelo que me cerca. Tenho buscado me aproximar dos desafios nos quais nem sempre estarei com o controle em minhas mãos, me lançando em terrenos desconhecidos para poder conhecê-los.

Em nosso íntimo há fome e sede de beleza, de amor, de conhecimento. Há muitas fomes, algumas guardadas, outras sufocadas. Mas basta lançarmos atenção para o que está aqui dentro e tudo isso desperta! Em alguns momentos podemos até ficar um pouco zonzas e ansiosas. É porque nos damos conta de que estivemos famintas por um longo tempo.

São tantas fomes e sedes, cada uma de um elemento: flor, mapa, luz do sol, frio da lua, batalhas, cafuné… E cada uma carece se expressar e se realizar no mundo.

Não devemos travar uma luta desenfreada contra o tempo. Pelo contrário, é indispensável organizar internamente tanto sonho, tanta possibilidade ou acabamos assim tão fascinadas que paralisamos.

Precisamos vivenciar o passo-a-passo, os ciclos, encontrando o equilíbrio entre caminhar contra o tempo ou usá-lo como escudo deixando tudo sempre para depois. Nem mulher-maravilha, nem donzela-na-janela. Em cada um desses extremos acabamos deixando de viver de maneira absoluta o hoje e suas possibilidades de crescimento.

Como você viveu suas últimas horas? Como pretende viver as próximas? Refletir sobre nosso ritmo é um importante passo para escolhermos que tipo de vida queremos levar de agora em diante.

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